19 fevereiro, 2007

Um susto




Um susto. O despertar súbito. Os olhos se abrem instantaneamente buscando uma resposta. Mas não a encontram. Num esforço descomunal, arregalam-se, mas não há nada além da escuridão. Há um vago odor vegetal, mas não é o cheiro do amanhecer orvalhado. Os braços abandonam o repouso para buscar no chão surpreendentemente limpo e liso um apoio para ficar de pé. As costas estão doloridas, mas os pés não.

Passos medrosos, as mãos trêmulas buscam algo palpável, que possa orientar. Ao erguerem-se acima da cabeça, as mãos encontram um teto. Não é um teto uniforme feito o chão. As mãos o apalpam e encontram longos espinhos, pequenas folhas e galhos muito juntos, retorcidos, ásperos. É dali que vem o cheiro de vegetação.

Os olhos permanecem abertos, mas nada vêem. Inicia-se então uma lenta caminhada. A direção escolhida é rumar em frente, já que tudo é breu. As mãos seguem tateando o caule coberto de espinhos. Os pés simplesmente obedecem à intenção de caminhar, sempre em frente.

Um sentimento de profunda angústia passa a apertar o peito, como se o coração estivesse sendo esmagado. Essa sensação de compressão só aumenta, assim que as mãos se dão conta de que os joelhos vão precisar se dobrar, pois o teto de espinheiros está ficando cada vez mais baixo. Mais alguns passos adiante e é preciso rastejar. O chão liso facilita esta tarefa, mas os espinhos roçam-lhe os cabelos.

Neste momento o desespero é total, mas é preciso seguir em frente e quem sabe, encontrar a luz. Mas alguns metros rastejando e resolve voltar-se para cima, para só então tentar mover aqueles galhos espinhentos. Foi uma operação muito delicada. Apenas defendeu os olhos com uma das mãos e com a outra impulsionou o corpo num giro de 180 graus, que rasgou toda a lateral das roupas e lhe rendeu incontáveis arranhões.

Voltada com a barriga para cima, a primeira providência a ser tomada foi quebrar os espinhos que lhe ameaçavam os olhos. Em seguida, mãos, antebraços, cotovelos, joelhos, canelas e pés, se reuniram para tentar mover o emaranhado de galhos, espinhos, minúsculas folhas... Foi inútil este esforço conjunto, pois nada sequer se moveu. Foram sucessivas tentativas, todas em vão.

Tudo o que queria era ver a luz, estar livre, poder ir para onde quisesse, fazer o que lhe desse na veneta, mas estava presa e todas as tentativas de fuga, de libertação eram inúteis. Poderia tentar voltar, mas desmaiou ali mesmo, extenuada, perdida entre lágrimas e soluços. Talvez um dia acordasse e conseguisse mover aquele teto de espinheiros, e quem sabe conhecer a liberdade.

6 comentários:

Aokittos disse...

Nossa..que bom isso, quero vc pra ajudar no meu roteiro.

Luiz Longo disse...

ADORO a subjetividade!

Muito bom, parabéns!


Ah! Pra te soltar, é só chamar o jardineiro! =]

Anônimo disse...

hhahaha
jardineiro
:D

pensei q iria descobrir onde o assustado tava.. bãããt não =P

acho q tava a boca de um enorme jacaré herbivoro o// :S

Cadu disse...

veneta!
Talvez um dia ela acorde!

Aquele abraço!

Cadu disse...

ã, se tiver afim, dá uma passada lá: http://www.repolhoroxo.blogger.com.br
é modesto, mas enfim...

Anônimo disse...

"Tudo o que queria era ver a luz, estar livre, poder ir para onde quisesse,..."

liberdade..
gostei, saritinha!!
beijos